A percepção de comunidades tradicionais pantaneiras a respeito dos impactos dos incêndios florestais de 2020

Daniel de Oliveira d’El Rei Pinto1*

https://orcid.org/0009-0008-4661-1356

* Contato principal

Fernando Francisco Xavier2

https://orcid.org/0009-0001-8957-2851

Cesar Augusto Chirosa Horie3

https://orcid.org/0000-0002-8440-5819

Daniel Guimarães Penteado3

https://orcid.org/0000-0001-5449-1851

Claudia Regina Sala de Pinho4

https://orcid.org/0009-0005-1689-0305

1 Habitat Geo Consultoria, Brasil. <daniel@habitatgeo.com.br, liviamendonca.geo@gmail.com>.

2 Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade/ICMBio, Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, Chapada dos Guimarães/MT, Brasil. <fernando.xavier@icmbio.gov.br>.

3 Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade/ICMBio, Brasil. <cesar.horie@icmbio.gov.br, daniel.penteado@icmbio.gov.br, gabrielle.soeiro@icmbio.gov.br>.

4 Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira, Brasil. <claudiapantanal@gmail.com, rctpantaneira@gmail.com, waldilenoxavierdn@gmail.com>.

Edinalda Pereira do Nascimento4

https://orcid.org/0009-0009-9852-0576

Waldileno Xavier da Silva4

https://orcid.org/0009-0009-4036-8735

Leonida Aires de Souza4

https://orcid.org/0009-0004-5856-7461

Lívia Ferreira de Mendonça1

https://orcid.org/0009-0000-4522-5965

Louiziane Gabrielle Souza Soeiro3

https://orcid.org/0009-0008-7778-4460

RESUMO – O presente trabalho apresenta os resultados de uma investigação conduzida junto às comunidades Piúva, Piraim e Barra do São Lourenço, no bioma Pantanal, para avaliar o efeito dos incêndios florestais de 2020 sobre as comunidades e seus modos de vida. Por meio de visitas técnicas, incluindo rodas de conversa e oficinas, nas quais foram colhidos relatos dos participantes, foram identificados impactos diretos e indiretos sobre as comunidades e suas práticas cotidianas, classificados de acordo com o tipo de efeito, sua magnitude e importância. Tais impactos envolvem as atividades econômicas, a saúde pública e o manejo dos recursos naturais do Pantanal. O manejo integrado do fogo e uma abordagem de etnoconservação são sugeridos como estratégia para a atuação do bioma junto às comunidades tradicionais.

Palavras-chave: Incêndios florestais; sociobiodiversidade; Pantanal; manejo integrado do fogo.

The perception of traditional Pantanal communities regarding the impacts of the 2020 forest fires

ABSTRACT – This work presents the results of an investigation conducted with the Piúva, Piraim, and Barra do São Lourenço communities in the Pantanal biome to evaluate the effect of the 2020 forest fires on the communities and their ways of life. Through technical visits, including discussion circles and workshops, in which participants’ reports were collected, direct and indirect impacts on the communities and their daily practices were identified, classified according to the type of effect, its magnitude, and importance. These impacts involve economic activities, public health and the management of Pantanal’s natural resources. Integrated fire management and an ethnoconservation approach are suggested as strategies for the biome’s engagement with traditional communities.

Keywords: Forest fires; sociobiodiversity traditional communities; Pantanal; integrated fire management.

La percepción de las comunidades tradicionales del Pantanal sobre los impactos de los incendios forestales de 2020

RESUMEN – El presente trabajo presenta los resultados de una investigación realizada en las comunidades de Piúva, Piraim y Barra do São Lourenço, en el bioma Pantanal, para evaluar el efecto de los incendios forestales de 2020 sobre las comunidades y sus modos de vida. A través de visitas técnicas, incluyendo círculos de discusión y talleres, en los cuales se recopilaron relatos de los participantes, se identificaron impactos directos e indirectos sobre las comunidades y sus prácticas cotidianas, clasificados según el tipo de efecto, su magnitud e importancia. Estos impactos involucran actividades económicas, salud pública y el manejo de los recursos naturales del Pantanal. Se sugiere el manejo integrado del fuego y un enfoque de etnoconservación como estrategia para la actuación del bioma junto a las comunidades tradicionales.

Palabras clave: Incendios forestales; sociobiodiversidad; Pantanal; manejo integrado del fuego.

Recebido em 14/03/2024 – Aceito em 22/08/2024

Como citar:

d’El Rei Pinto DO, Xavier FF, Horie CAC, Penteado DG, Pinho CRS, Nascimento EP, Silva WX, Souza LA, Mendonça LF, Soeiro LGS. A percepção de comunidades tradicionais pantaneiras a respeito dos impactos dos incêndios florestais de 2020. Biodivers. Bras. [Internet]. 2024; 14(4): 183-201. doi: 10.37002/biodiversidadebrasileira.v14i4.2568

Introdução

O presente estudo é resultado das investigações conduzidas pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiversidade Associada a Povos e Comunidades Tradicionais (CNPT), ligado ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), com o objetivo de avaliar os impactos do fogo sobre os povos e comunidades tradicionais do Pantanal em três localidades distintas.

No ano de 2020, o Pantanal teve cerca de um terço da área do bioma afetado por incêndios (3,9 milhões de hectares), tendo sido registrados cerca de 15 mil focos de calor [1]. Segundo Libonati et al. [2], as causas dos incêndios estão relacionadas “a uma combinação de gerenciamento inadequado de incêndios, extremos climáticos, comportamento humano e regulamentações ambientais fracas”. Para Leal Filho et al. [3], os atuais problemas de incêndios no Pantanal se devem a uma combinação de fatores climáticos e atividades humanas na planície e nos planaltos circundantes, que contribuem para a redução da disponibilidade hídrica na planície. Segundo esses autores, a drenagem de ambientes inundáveis, a ocupação de áreas de preservação permanente e a instalação de usinas hidrelétricas podem afetar o pulso de inundação na planície, o que, combinado com os incêndios, pode comprometer a resposta e recuperação dos ambientes.

Modelos globais preveem um aumento da temperatura, que para o Pantanal pode chegar a mais de 7°C da atual, além da diminuição das chuvas no verão e particularmente, no inverno. A possibilidade de secas mais longas e aumento da evaporação podem afetar o balanço hídrico na região [4], que já possui alta variabilidade interanual de precipitação, segundo análise de tendências mensais de precipitação de 1977 a 2006 [5]. Prevê-se que o escoamento médio anual na região diminua em cerca de 0,1–0,2 mm/dia, e com a redução da umidade relativa em cerca de 4–8%, há uma tendência de aumento da evaporação em cerca de 0,2–0,4 mm/dia e, consequentemente, uma redução na umidade do solo próximo à superfície em cerca de 1–2 mm/dia [4]. Esses fatores, associados a ondas de calor, são determinantes na propagação de incêndios florestais no Pantanal.

A compreensão dos impactos dos incêndios florestais que acometeram o bioma Pantanal em 2020, sobre a biodiversidade e as comunidades tradicionais, é imprescindível para o planejamento de ações de manejo para a conservação. A diversidade de povos e comunidades tradicionais no Pantanal está demonstrada no mapeamento das comunidades tradicionais e grupos sociais de Mato Grosso, elaborado por Silva [6], no qual figuram povos pantaneiros, acampados, agricultores familiares, artesãos, assentados, grupos de siriri, cururu e dança de congo, povos extrativistas, povos indígenas, povos quilombolas e povos ribeirinhos. Sato e colaboradores [7] indicam a existência de 67 comunidades tradicionais apenas no Pantanal Norte, incluindo pescadores e agricultores.

Na planície inundável do Pantanal Norte/MT, Rossetto e Tocantins [8] identificaram cerca de 4,5 mil pescadores profissionais artesanais. No Pantanal Sul/MS, estimativas apontam para cerca de 2.600 pescadores profissionais [9], dados que revelam a diversidade de comunidades e formas de manejo dos ambientes pantaneiros.

Essa diversidade ambiental e cultural indica a necessidade de pesquisas de cunho socioambiental que investiguem a relação de comunidades tradicionais e os ambientes pantaneiros e que possam ampliar o conhecimento sobre o Pantanal e as possibilidades de manejar os recursos naturais do bioma.

Atualmente, o conjunto de fatores que afetam o meio ambiente como um todo, incluindo a perda da diversidade biológica, a extinção de espécies, a perda de habitat tem levado os cientistas a denominarem a atual era de Antropoceno [10]. Essa acelerada destruição dos recursos e ambientes do planeta tem elevado a discussão das mudanças climáticas ao que se pode ser chamado de “emergência climática” [11]. Nesse cenário de crise, as comunidades tradicionais e seus conhecimentos e formas de manejo dos ambientes podem contribuir para a compreensão de mecanismos e formas de conservação e manejo dos ambientes e espécies. Compreender o impacto dos incêndios florestais sobre essas comunidades implica também a necessidade de se conhecer as formas de uso e manejo dos recursos e incluir, além das questões que envolvem a perda da biodiversidade, aspectos econômicos, de saúde pública e ameaça aos territórios e à vida humana, aspectos fundamentais para a conservação da vida, do saber-fazer das comunidades e, por decorrência, da própria biodiversidade no Pantanal. O presente trabalho visa identificar e avaliar os impactos do fogo e qualificar os efeitos do impacto sob a ótica dos povos e comunidades tradicionais.

Material e Métodos

Área de estudo

O Pantanal é uma área úmida de importância internacional, formado pelos rios da Região Hidrográfica da Bacia do Alto Paraguai (BAP) e reconhecido patrimônio nacional pela Constituição Federal de 1988 [12]. Está localizado entre os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, com respectivamente 35% e 65%, de área em cada um desses estados, totalizando cerca de 138 mil km², além de estender-se em áreas da Bolívia e Paraguai [13]. Ainda segundo Silva e Abdon [13], os municípios de Barão de Melgaço (MT) e Corumbá (MS) são aqueles com maior área de seu território no Pantanal (99,2% e 95,6%, respectivamente).

O bioma é uma área relativamente plana no território brasileiro, com um aspecto de anfiteatro, “cujas dinâmicas ecológica e socioeconômica estão fortemente associadas às influências diretas e indiretas advindas das regiões de planalto adjacentes, bem como ao regime hidrológico da Bacia do Alto Rio Paraguai” [14]. Apesar do nome “pantanal” indicar áreas de pântanos, o bioma inclui áreas não inundáveis e pode ser caracterizado como um mosaico de áreas úmidas, com diferentes gradientes climáticos, hidrológicos e topográficos [15].

Segundo Cunha e Junk [16], o Pantanal pode ser classificado como uma área úmida, sujeita a um pulso de inundação sazonal, que promove o intercâmbio lateral de águas, nutrientes e organismos nesse ambiente e que, combinado com as feições geomorfológicas, formam diferentes macrohabitat com importância fundamental para a manutenção da diversidade biológica e da produção do sistema. As áreas mais próximas dos canais dos rios são mais profundas e as áreas fora das calhas são mais extensas e mais rasas, inclusive com áreas secas, que constituem a zona de transição aquática e terrestre (ATTZ, do inglês).

O trabalho junto às comunidades tradicionais compreendeu o mapeamento prévio das comuni-dades a partir da literatura disponível, a articulação com lideranças e a avaliação da percepção dos impactos em três comunidades tradicionais. A escolha das comunidades foi feita em articulação com a Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira, que mobiliza as comunidades em ações sociopolíticas de incidência em políticas públicas do bioma. A Rede é uma entidade da sociedade civil formada por representantes de comunidades pantaneiras dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, responsável por articular as comunidades e promover o debate de políticas públicas, identidades e conflitos socioambientais no bioma. Ela representa as comunidades no Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais, de caráter consultivo, instituído pelo Decreto Federal n. 8.750, de 09/05/2016, e que tem como objetivo coordenar e monitorar a implementação da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Duas premissas guiaram a escolha. A primeira delas foi a necessidade de contemplar a diversidade de ambientes do bioma pantaneiro, que pudesse refletir as áreas mais altas e mais baixas da planície, com regimes de inundação diferenciados. A segunda premissa foi refletir a diversidade cultural e o impacto que as comunidades sofreram com os incêndios de 2020, incluindo grupos que atuam com pesca artesanal, criação de gado e outras atividades produtivas.

Um protocolo de consulta foi elaborado pela Rede, que definiu as comunidades Piúva e Piraim, caracterizadas como Alto e Médio Pantanal, respectivamente, e a Comunidade da Barra do São Lourenço, indicada como área alagável pela Rede (Figura 1). Elas estão localizadas nos municípios de Barão de Melgaço e Corumbá. Piraim é formada por duas localidades diferentes, sendo uma dessas próxima à área urbana de Barão de Melgaço (Piraim de Cima) e a outra situada na confluência dos rios Piraim e Cuiabá.

Em atenção ao protocolo da Rede (Material Suplementar), as visitas às comunidades foram realizadas com a presença de um de seus coordenadores

Coleta de dados

Foram realizadas visitas técnicas às três comunidades, que permitiram a identificação dos impactos do fogo vivenciado pelos moradores, além de dar voz e visibilidade a pessoas e lugares frequentemente negligenciados pelo poder público, em duas campanhas de campo.

A primeira delas foi feita entre os dias 30 de maio e 03 de junho de 2022, nas comunidades Piúva, Piraim e Barra do Piraim, no município de Barão de Melgaço/MT. Na comunidade Piúva, foram feitas visitas individuais a algumas famílias e nas comunidades Piraim e Barra do Piraim foram realizadas rodas de conversas. Segundo Moura e Lima [17], “a roda de conversa é, no âmbito da pesquisa narrativa, uma forma de produzir dados em que o pesquisador se insere como sujeito da pesquisa pela participação na conversa e, ao mesmo tempo, produz dados para discussão. É, na verdade, um instrumento que permite a partilha de experiências e o desenvolvimento de reflexões sobre as práticas educativas dos sujeitos, em um processo mediado pela interação com os pares, através de diálogos internos e no silêncio observador e reflexivo”. Essa visita teve um relevante papel no estreitamento do CNPT com as comunidades e os representantes da Rede.

A segunda visita foi realizada entre 28 de novembro e 02 de dezembro de 2022, na Comunidade Barra do São Lourenço, município de Corumbá/MS, onde foi realizada uma roda de conversa e oficina para identificação dos impactos do fogo, além de vista a campo com membros da comunidade. A oficina compreendeu a realização de uma reunião com moradores da comunidade, em horário previamente acordado com os representantes da comunidade e buscou a participação de homens e mulheres de idades diferentes.

Na oficina, os moradores da comunidade foram convidados a identificar os impactos do fogo por eles percebidos, a levantar possíveis soluções para superação de impactos do fogo, além de indicar instituições parceiras da comunidade. Os participantes ranquearam os impactos e possíveis medidas de superação, sinalizando-os com adesivos. Essas abordagens estão baseadas em Mikkelsen [18], que enfatiza que o ranqueamento ou a pontuação de temas de interesse têm sido usados há muito tempo para avaliar expectativas, preferências ou opiniões das pessoas. Para a autora, as abordagens participativas oportunizam que as pessoas decidam sobre suas próprias vidas, ou seja, falem por si mesmas acerca dos problemas que as afligem.

Análise dos dados

A identificação e a avaliação de impactos decorrentes de uma determinada situação envolvem uma análise integrada de diversos componentes em interação. Neste estudo, os impactos, sob a ótica das comunidades tradicionais visitadas, foram analisados por meio da matriz de identificação de impactos, adaptada de Sanchez [19]. O Quadro 1 apresenta os parâmetros utilizados quanto à classificação do impacto (tipo de efeito positivo ou negativo), magnitude (abrangência, temporalidade e duração) e importância (forma, reversibilidade, cumulatividade, sinergismo e mitigabilidade).

Resultados e Discussão

A visita às comunidades em Barão de Melgaço permitiu identificar uma matriz preliminar de impactos nas rodas de conversas realizadas (Figura 2).

Nessas reuniões, foi realizado o levantamento preliminar de impactos do fogo vividos pelos ribeirinhos, destacados no Quadro 2.

Na segunda campanha de campo, na comunidade de Barra do São Lourenço, foi possível estabelecer um diálogo mais amplo, em uma oficina na qual foram levantados os impactos do fogo e possíveis formas de superação, além da identificação de potenciais instituições parceiras da comunidade (Quadro 3).

Os impactos considerados mais relevantes foram o assoreamento de rios e baías, diminuição da renda e empobrecimento do solo. Como forma de superação, os participantes atribuíram maior peso a medidas para limpeza e desobstrução dos corpos d’água como forma de impedir a expansão da área de fogo e garantir maior mobilidade para navegação, tanto dos moradores como de profissionais envolvidos no combate aos incêndios (Figura 3).

Os impactos levantados pelas comunidades estão descritos no Quadro 4. Para cada um dos impactos identificados, são tecidas as considerações de acordo com o que foi abordado pelos representantes das comunidades participantes das reuniões ou oficina:

No presente trabalho, optou-se por não agrupar os diferentes tipos de impactos em categorias, considerando que os mesmos foram elencados como se encontram descritos a partir da fala das comunidades. O agrupamento dos impactos em categorias (social, econômico ou ambiental, por exemplo) pode não refletir a fala e a intencionalidade dos ribeirinhos. A destruição dos cupinzeiros pelos incêndios (item 3 do Quadro 4), por exemplo, tem relação estreita com a prática da pesca artesanal, uma vez que os cupins são iscas para a captura de tuviras que, por sua vez, são vendidas como iscas para pescadores amadores, de tal modo que o impacto poderia ser caracterizado como ambiental se levada em conta a perda propriamente dita das colônias de insetos, econômico se se considerar a perda da renda em função da redução da captura e venda de iscas vivas, ou social se considerado um aspecto mais amplo de mobilidade dos pescadores para a busca de novos cupinzeiros ou o impacto da redução da renda a médio prazo no sustento das famílias.

A comunidade apontou a perda de espécies e diferentes habitat, o assoreamento dos corpos d’água e outros desequilíbrios ao bioma como impactos relevantes. Segundo os moradores, os caranguejos foram predados por ratos que passaram a ocorrer em abundância após a morte de cobras nas áreas atingidas pelo fogo, evidenciando um possível desequilíbrio nas relações tróficas com consequências diretas ao bem-estar dos ribeirinhos. Os caranguejos são vendidos como iscas vivas pelos ribeirinhos aos pescadores amadores, especialmente na Comunidade da Barra do São Lourenço.

Aspecto parecido foi apontado em relação à predação de animais domésticos, especialmente cães, fenômeno percebido como consequência da diminui-ção de presas naturais das onças. Não há números exatos sobre a quantidade de animais domésticos predados, mas os relatos remetem a dezenas.

Ressalta-se um aspecto institucional levantado pelos comunitários, que diz respeito à falta de comu-nicação sobre as ações empreendidas no combate aos incêndios. Especialmente na Comunidade Barra do São Lourenço, foi enfatizada a necessidade de que as comunidades possam estar cientes das ações em andamento nos incêndios, como por exemplo quando e onde são realizadas ações de contrafogo ou sobre a direção das frentes e velocidades dos incêndios, de modo que os moradores possam adotar ações de prevenção em tempo hábil e com segurança. Melhores mecanismos de comunicação junto às comunidades podem reduzir tais riscos.

Destacam-se também aspectos institucionais acerca do manejo das áreas úmidas, especialmente no que concerne à manutenção e limpeza dos corpos hídricos, que na visão dos ribeirinhos se constitui como ação fundamental para a manutenção do fluxo das águas e redução do acúmulo de matéria orgânica nos canais. Em outras palavras, a redução da biomassa é vista pelos moradores como um aspecto importante para a prevenção de incêndios. A queima de pastagens nativas como estratégia de manejo dos moradores foi apontada como uma ação que previne incêndios e evita a morte do gado (comunidade Piúva).

Três aspectos levantados pelas comunidades não têm relação direta aparente com os incêndios, mas atuam de maneira sinergética em relação a estes, e envolvem a desestruturação dos usos e acessos a recursos naturais e a áreas de moradia e das demais atividades dos ribeirinhos. Foram indicados como “desestruturação social e comprometimento da reprodução de peixes e de acesso”, “conflitos territoriais com grandes proprietários de terra” e “projetos que não refletem a realidade das comuni-dades do Pantanal” (itens 7, 8 e 15 do Quadro 4).

O primeiro se refere à construção do Aproveitamento Múltiplo de Manso (ou simplesmente Usina Hidrelétrica de Manso) que, segundo os ribeirinhos, reduziu a disponibilidade hídrica no Pantanal, afetando a pesca e potencializando incêndios florestais. Os impactos desse empreendimento são apontados por Calheiros et al. [12], como a redução do desembarque pesqueiro na bacia, o aumento do nível de água do rio Cuiabá no período seco e a diminuição de área de pastagens na fase de seca em comunidades tradicionais ribeirinhas como as da localidade de Mimoso, no município de Barão de Melgaço.

O segundo aspecto se refere ao deslocamento de comunidades com a criação de unidades de conservação no lugar de grandes fazendas do Pantanal. É o caso da Barra do Piraim, onde diversos moradores viviam nas áreas hoje constituídas como Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) SESC Pantanal e na comunidade da Barra do São Lourenço, circundada por outras reservas particulares. No primeiro caso, moradores enfatizaram terem recebido indenizações, mas que estas não foram compatíveis com a perda de áreas para a agricultura e pesca que desempenhavam antes da criação da área protegida. Relatam ainda que há uma fiscalização exagerada, que os impede de utilizar o rio Piraim como utilizavam antes da RPPN. No segundo caso, o acesso aos rios para a pesca e áreas para extrativismo vegetal foram proibidos com a criação das unidades de conservação. Tais aspectos per se não têm relação direta com os incêndios, mas a redução do acesso aos recursos naturais e das áreas de uso das comunidades são mais sentidas quando as áreas são atingidas por incêndios. Os recursos naturais (como madeira, palha, peixe etc.) disponíveis nas proximidades, no interior das áreas protegidas, não pode ser acessado. Isso, somado ao fato de que grande parte das equipes de combate a incêndios são mobilizadas para a proteção das áreas protegidas e não diretamente nas comunidades, segundo informado, cria situações de constrangimento aos moradores e o sentimento de desvalorização das comunidades pantaneiras.

O terceiro aspecto se trata da procura das comunidades por instituições ou pessoas interessadas em implementar projetos sem estrutura ou continuidade – como, por exemplo, projetos de recuperação de áreas queimadas por meio do plantio de espécies inadequadas para o local e sem estrutura de apoio da e para a comunidade – durante e depois dos incêndios florestais. Na visão das comunidades, tais projetos não refletem a realidade local e utilizam os ribeirinhos para melhoria da imagem das instituições proponentes, sem mitigação dos problemas ambientais. Mesmo não tendo sido um tema cujo debate tenha se esgotado durante a oficina, os participantes entendem que, ainda que se destinem recursos humanos e financeiros para projetos no bioma, muitas vezes não possuem um caráter transformador, sobretudo em relação à sociobiodiversidade.

A diminuição da atividade de pesca amadora e da coleta de iscas vivas são impactos relevantes para as comunidades, porque prejudica diretamente as atividades dos pescadores. Além da dificuldade da coleta de iscas nas comunidades, o deslocamento para pescar em áreas mais distantes aumenta as despesas e reduz o ganho da pesca.

Os impactos do fogo indicados se referem tanto a impactos ambientais quanto às condições socioculturais das comunidades. O registro de tais impactos, sem recategorizações mais amplas pela equipe de pesquisa, foi feito justamente para refletir a percepção das comunidades sobre os incêndios de 2020.

Na Comunidade da Barra do São Lourenço, os impactos identificados e pesos atribuídos têm relação direta com a atividade da pesca artesanal (Gráfico 1), como é o caso da redução de peixes, da redução de iscas (cupins, tuviras, caranguejos, por exemplo) e nas demais atividades econômicas da comunidade (agricultura).

Entre os impactos apresentados, pode-se destacar a questão do acesso aos territórios tradicionais, seja no que se refere a rios e outros cursos d’água para a pesca, seja no estabelecimento de unidades de conservação ou mesmo projetos de desenvolvimento que, na percepção das comunidades, pouco integraram os meios de vida desses povos e comunidades tradicionais no desenvolvimento das políticas públicas para o bioma Pantanal. As políticas de criação de unidades de conservação mantiveram-se, ao longo dos anos, voltadas a estratégias que não integraram a comunidade na definição das áreas protegidas. O mesmo se dá em relação à política de proteção e combate a incêndios florestais. Nos últimos anos, brigadas comunitárias foram formadas nas comunidades, mas a oficina na Comunidade da Barra do São Lourenço indica a necessidade de ampliar o diálogo para o estabelecimento de parcerias no manejo do fogo.

Dentre as possíveis soluções apontadas pelos participantes da oficina, o “Fortalecimento de parcerias para limpeza de rios como ações preventivas” e a “Limpeza de rios navegáveis (facilitando a navegação e oxigenação das águas)”, foram aqueles que tiverem maior peso atribuído, com 6 e 5 indicações respectivamente. O acesso e a limpeza de rios e outros cursos d’água navegáveis pode ser uma possibilidade de mitigação de impactos dos incêndios. Segundo as comunidades, a limpeza de corpos d’água reduz a quantidade e o tempo de permanência de material vegetal flutuante nesses canais, o que reduz os riscos e a magnitude de incêndios florestais. Na região da Barra do São Lourenço, por exemplo, os pescadores afirmam que a limpeza do batume (capim flutuante) nas baías no período de novembro a dezembro poderia propiciar seu deslocamento com o aumento do fluxo da água, uma vez que o capim pode ser carreado pelo vento, reduzindo os riscos de incêndio no período mais seco. Ao mesmo tempo, essa limpeza propicia aos pescadores artesanais o acesso a uma maior rede de baías e, por isso, favorece a oferta de iscas para sua atividade, reduzindo a pressão sobre populações isoladas de iscas. Tal estratégia de manejo precisa ser testada, de maneira que o conhecimento tradicional pode ser um elemento importante a ser incorporado no manejo dos ambientes inundáveis do Pantanal por órgãos de gestão ambiental, como o ICMBio, na gestão das paisagens a serem protegidas. Essa perspectiva de conservação embasa um enfoque conservacionista denominado etnoconservação, com importância especial nas estratégias de conservação in situ, no manejo dos recursos naturais, na relação com a ocupação do território das comunidades tradicionais e com a dinâmica dos ecossistemas naturais [20]. Ela reconhece a diversidade ambiental como consequência de uma relação histórica entre comunidades tradicionais e os ambientes e propõe a participação das comunidades e a incorporação de conhecimentos tradicionais e científicos, em igual importância, na formulação de políticas de conservação [21].

As instituições parceiras para a superação dos problemas elencados são importantes atores para a articulação de ações de pesquisa, recuperação ambiental, combate a incêndios e para a consecução de outras políticas públicas, como a construção de moradias, como ficou evidenciado na Comunidade da Barra do São Lourenço. Há confiança demonstrada pela comunidade nos órgãos públicos das três esferas de governo, sendo que o ICMBio figura como destaque na garantia das áreas de pesca e moradia da comunidade, seja em relação às unidades de conservação estabelecidas ou na proposição de novas áreas. O Ministério Público Federal e a ONG Ecoa, atuantes na comunidade, também figuram como parceiros potenciais. Dos impactos elencados no Quadro 4, 73% podem ser considerados reversíveis, o que abre possibilidades de atuação das instituições para ações de prevenção, combate ou recuperação pós incêndios, ou na elaboração de políticas públicas junto às comunidades, como moradia, por exemplo.

No caso do fogo, o ICMBio tem adotado a perspectiva de manejo integrado do fogo (MIF) em várias unidades de conservação [22], sendo que tais práticas tradicionais aqui descritas e a própria integração com as comunidades pode ser uma estratégia a ser adotada no MIF no Pantanal. O manejo pode contribuir para evitar grandes incêndios e queimadas inadequadas, trazendo o fogo para dentro de um regime previsível, que pode ser manejado de modo seguro e eficiente, com vistas à conservação da sociobiodiversidade pois considera a cultura, o manejo e a ecologia do fogo [23]. No Pantanal, as áreas protegidas estão adotando o conceito do MIF – em fase de implantação na Estação Ecológica de Taiamã, em fase de elaboração no PARNA do Pantanal Matogrossense, e já é realidade em terras indígenas (TI) Kadiweu e Terena. Análises da ocorrência do fogo dentro da TI Kadiweu, antes e após o MIF, com aplicação de queimas prescritas, mostram uma diminuição da área queimada, menor número de focos de calor nos períodos de menor precipitação e menores cicatrizes de queima [24].

A implementação do MIF nas terras indígenas possibilitou a integração das realidades socioculturais e das necessidades ecológicas com abordagens tecnológicas, proporcionando o resgate do conhecimento tradicional sobre o uso do fogo e o desenvolvimento de uma metodologia de planejamento e aplicação que respeita e valoriza as comunidades locais [25]. Faz parte de um processo de mudança de paradigma, de uma “política de fogo zero” para o MIF, que reconhece o importante papel ecológico do fogo em alguns ecossistemas, com elevada importância para a inclusão da participação social [23][26][27].

Nas comunidades ribeirinhas do Pantanal, o fogo é manejado para roças e renovação de pastagem, práticas ancestrais e transmitidas por gerações. Nas comunidades de Piraim de Baixo e no rio Cuiabá, houve relatos que a proibição de “cortar mato e botar fogo”, fez acumular muito combustível “apodrecendo no chão”. Quando o fogo atinge tais áreas não manejadas, o controle se torna muito difícil. Durante décadas a política do “fogo zero” considerou o fogo como um problema a ser prevenido e combatido, principalmente quando se trata de áreas protegidas. No entanto, essa condição tem sido revista. A justificativa é que, ao eliminar o fogo, há uma tendência de acúmulo de biomassa combustível, e consequentemente, maior sujeição a incêndios de alta intensidade, o que não ocorre em áreas esporadicamente queimadas.

Portanto, em sistemas complexos, onde os eventos de fogo dependem de uma série de fatores ecológicos, climáticos e sociais, que se insere o MIF. Nesta abordagem, são considerados diversos fatores na tomada de decisão de inserir ou não o fogo no manejo das áreas. O MIF considera o conhecimento disponível para analisar as necessidades e impactos socioeconômicos, os atributos ecológicos do fogo no ambiente e as ações de manejo, entre elas o planejamento de ações de prevenção, a supressão e o uso do fogo, o manejo de combustível com objetivo de diminuir a ocorrência de combate a incêndios florestais, a valorização do conhecimento tradicional e a conservação da biodiversidade, em uma perspectiva de manejo adaptativo [23]. Para tanto, é imprescindível o aporte da pesquisa científica.

No presente trabalho, as comunidades observaram que os incêndios de 2020 “limparam” um pouco as áreas, antes mais fechadas, mas muitas árvores morreram também. Foram relatados prejuízos de queimas de pastagens e cercas, além de cabeças de gado. Nas comunidades consultadas, tais impactos afetaram as cadeias produtivas de mel e da pesca profissional, especialmente a captura de iscas vivas que, por sua vez, são comercializadas para a pesca esportiva. Os incêndios do verão de 2019/2020 tiveram custos em termos de danos em propriedades, biodiversidade, saúde pública e na economia. As queimas prescritas são essenciais para manejar esses incêndios [28].

Uma revisão sobre o impacto dos incêndios florestais na saúde mental analisou 254 estudos e observou um aumento nas taxas de transtorno de estresse pós-traumático, depressão e ansiedade generalizada, tanto na fase aguda após os incêndios como anos depois [29]. Nenhum desses estudos foi realizado no Brasil, mas é possível que processos semelhantes ocorram nas comunidades do Pantanal. Na comunidade da Barra do São Lourenço, em 2020, moradores observaram por semanas, as fumaças crescentes, clarões no horizonte durante a noite, anunciando o incêndio que se aproximava que atingiu a comunidade, causando transtornos econômicos e ao bem-estar das pessoas.

O desenvolvimento da resiliência dessas comunidades é possível quando governos, sociedade civil e setor privado, fazem escolhas inclusivas, que dão prioridade à redução de riscos, equidade e justiça; os processos de tomada de decisão, o financiamento e as ações integram todos os níveis de governança [30]. Melhorar o acesso a recursos financeiros adequados é importante, especialmente para as comunidades colocadas em situação de vulnerabilidade, como é o caso das comunidades atingidas pelos incêndios e visitadas, para atendimento de suas necessidades.

Dentre os impactos relatados pelas comuni-dades, o ataque de onças a animais domésticos foi um ponto de destaque. Parece haver múltiplos fatores que podem levar ao aumento dos ataques de onças no Pantanal. São necessários estudos para avaliar detalhadamente essas condições de risco, seja por meio de percepções de moradores, como de estudos sistemáticos para levantamento de ocorrências de onças e presas, próximas às comunidades.

Além da compreensão dos impactos causados pelo fogo e da prevenção de novos incêndios por meio do MIF, uma outra linha de conhecimento envolve a recuperação das áreas mais queimadas: o próprio sistema de inundação. No Pantanal, onde a dinâmica hidrológica e pulsos de inundação atuam como forças motrizes/propulsoras, a recuperação de ambientes degradados é uma tarefa complexa e desafiadora. Modelos de recuperação para esse tipo de ecossistema têm sido exaustivamente buscados em vários países. Consequentemente, o sucesso das ações de recuperação exige planejamento, bem como conhecimento sobre a dinâmica de inundação (frequência, amplitude e duração), distribuição das espécies e as peculiaridades de cada macrohabitat. A participação das comunidades tradicionais na recuperação do Pantanal, levando-se em consideração o que as próprias comunidades apontaram acerca da necessidade de construção de políticas públicas vinculadas à sua realidade sociocultural, pode ser fator importante para a convergência de ações nesse sentido. Iniciativas envolvendo as comunidades e organizações ambientalistas já se mostram presentes em comunidades do bioma, como é o caso de projetos levados a cabo em Corumbá e Cáceres, envolvendo comunidades tradicionais e organizações ambientalistas.

Conclusão

O presente trabalho identificou a percepção dos impactos do fogo nas comunidades visitadas em três regiões distintas do Pantanal. Os impactos identificados são uma inferência do panorama geral de como a biodiversidade e as comunidades tradicionais têm sido afetadas por incêndios flores-tais extremos no bioma. Considerando a variação ambiental das diferentes regiões que formam o bioma e a diversidade de grupos sociais e formas de organização, é necessário o desenvolvimento de mais estudos sobre o tema em outras comunidades pantaneiras.

O rol de impactos oportunizou a discussão acerca da fragilidade das comunidades no Pantanal e a suscetibilidade das mesmas à ocorrência de grandes incêndios, como foram os incêndios de 2020. Problemas relacionados à saúde, renda, segurança, práticas agropastoris, perda da biodiversidade e da disponibilidade hídrica no Pantanal, bem como problemas fundiários e institucionais, foram considerados em conjunto, na visão das comunidades, denotando uma visão integrada da situação pelos ribeirinhos.

Ações de prevenção e combate a incêndios florestais no Pantanal demandam o esforço de governo e sociedade na definição de estratégias e ações para garantir o bem-estar das pessoas e a conservação da natureza e precisam incluir o protagonismo das comunidades tradicionais pantaneiras, detentoras de um saber-fazer tradicional, que em muito pode contribuir para estratégias de conservação e manejo das espécies, ecossistemas e paisagens no Pantanal, numa perspectiva de etnoconservação, na qual os saberes tradicionais e acadêmicos podem articular soluções para a crise ambiental instalada. Adicionalmente, mudanças no paradigma da relação do homem e o fogo com experiências exitosas apontam na direção do MIF como uma potente ferramenta para conservação da sociobiodiversidade pantaneira. De modo similar, ações de recuperação ambiental podem ser levadas a cabo com maior êxito, considerando a realidade sociocultural das comunidades e as características ecológicas do bioma Pantanal.

O protocolo (Material Suplementar: https://drive.google.com/file/d/16vWplbNzUdCw_U4RA7SNo9Q5LWudEu7p/view?usp=sharing), desenvolvido pela Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira, que orientou a realização dos estudos, pode servir como modelo e orientação para pesquisas envolvendo as diversas comunidades tradicionais no Pantanal.

Agradecimentos

Agradecemos à Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira pelo apoio e pelo protagonismo nas ações desenvolvidas com o CNPT/ICMBio, às comunidades tradicionais participantes e às equipes do PARNA do Pantanal Mato-grossense e do PARNA da Chapada dos Guimarães pelo apoio logístico ao projeto.

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Figura 1 – Mapa da área atingida pelo fogo em 2020 e localização das comunidades do estudo.

Quadro 1 – Parâmetros para a Classificação do Impacto (adaptado de Sanchez, 2013).

Classificação do impacto

Tipo de efeito

Positivo/Negativo

Magnitude do impacto

Abrangência

Local/Entorno/Regional

Temporalidade

Curto Prazo/Médio Prazo/Longo Prazo

Duração

Temporária/Cíclica/Permanente

Importância do impacto

Forma

Direta (ou primária)/Indireta (ou secundária)

Reversibilidade

Reversível/Irreversível

Cumulatividade

Cumulativa/Não Cumulativa

Sinergismo

Sinérgico/Não Sinérgico

Mitigabilidade

Mitigável/Não mitigável

Figura 2 – Rodas de conversa na Comunidade da Piúva (A), Piraim (B) e Barra do Piraim (C) e Barra do São Lourenço (D).

Quadro 2 – Síntese preliminar de impactos do fogo nas comunidades visitadas.

IMPACTOS DIRETOS

Queima de pasto prejudicando a pecuária, que muitas vezes é praticada em pastos comunitários onde o gado é identificado por marcação

Queima e morte de gado

Destruição de cupinzeiros nas queimadas prejudicando a captura de isca de pesca (tuvira)

Queima da vegetação prejudicando a apicultura devido à floração tardia

Problemas de saúde oriundos da fumaça, atingindo principalmente idosos e crianças

Impactos diretos sobre fauna e flora decorrentes da perda de habitat

IMPACTOS INDIRETOS COM SINERGIA E/OU QUE POTENCIALIZAM IMPACTOS DIRETOS

Desestruturação social e comprometimento da reprodução de peixes e de acesso às comunidades em decorrência da implantação da usina hidrelétrica de Manso

Conflitos territoriais com grandes proprietários de terra (Ex.: RPPN SESC Pantanal/Comunidade Barra do Piraim)

Grupo de pessoas sentadas em cadeiras

Descrição gerada automaticamente com confiança média

Quadro 3 – Impactos, estratégias de superação e possíveis parceiros levantados durante a oficina na comunidade Barra de São Lourenço.

IMPACTOS

1. Calor intenso;

2. Queima de moradias;

3. Empobrecimento do solo;

4. Secamento dos corixos e baías;

5. Dificuldade de respirar;

6. Mortandade dos peixes pelo calor;

7. Projetos que não refletem a realidade das comunidades do Pantanal;

8. Perda de biodiversidade;

9. Nuvem de cinzas;

10. Perda de vidas;

11. Perda de local de reprodução das espécies;

12. Falta de comunicação, aumentando o risco;

13. Assoreamento;

14. Diminuição da renda da pesca;

15. Diminuição do turismo de pesca;

16. Predação de animais domésticos;

17. Invasão de ratos em áreas de cultivo;

18. Ocorrência de ratos predando caranguejos que são utilizados como isca de pesca, prejudicando atividade pesqueira.

SUPERAÇÃO

• Fazer aceiro no entorno das casas;

• Realizar queima prescrita;

• Diminuir o tempo de resposta das instituições de combate ao fogo;

• Reflorestamento com espécies nativas;

• Parcerias para capacitação e aporte de recursos para as comunidades no combate ao fogo;

• Construção de um posto de combate ao fogo;

• Apoio para reconstrução de moradias;

• Revisão da legislação para que seja permitida a limpeza preventiva ao fogo pela comunidade;

• Limpeza de rios navegáveis (facilitando a navegação e oxigenação das águas);

• Fortalecimento de parcerias para limpeza de rios como ações preventivas;

• Garantia de recursos para conservação do Pantanal;

• Manejo de rios dentro do Parque Nacional (PARNA) do Pantanal Mato-grossense.

POTENCIAIS INSTITUIÇÕES PARCEIRAS

• Governo dos Estados de MT e MS;

• ECOA – Ecologia e Ação

• EMBRAPA Pantanal– Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

• MPF – Ministério Público Federal

• Prefeitura Municipal de Corumbá

• Rede Pantaneira de Comunidades Tradicionais

• ICMBio

• ACERT – Associação Corumbaense das Empresas Regionais de Turismo

• Marinha do Brasil

• Universidades Públicas

Figura 3 – Resultado da oficina na comunidade Barra do São Lourenço, destacando o ranqueamento dos impactos e ações de superação apontadas (círculos colados nas tarjetas).

Quadro 4 – Impactos do fogo sobre as comunidades tradicionais do Pantanal, de acordo com Sanchez [18].

Classificação

Magnitude

Importância

Id

Impacto

Tipo de Efeito

Abrangência

Temporalidade

Duração

Forma

Reversibilidade

Cumulatividade

Sinergismo

Mitigabilidade

1

Queima de pasto

Negativo

Regional

Longo prazo

Temporária

Direta

Reversível

Não cumulativa

Não sinérgica

Mitigável

2

Queima e morte de gado

Negativo

Local

Médio prazo

Temporária

Direta

Irreversível

Não cumulativa

Não sinérgica

Não mitigável

3

Destruição de cupinzeiros

Negativo

Local

Médio prazo

Temporária

Indireta

Reversível

Não cumulativa

Não sinérgica

Não mitigável

4

Queima da vegetação

Negativo

Entorno

Médio prazo

Temporária

Indireta

Reversível

Não cumulativa

Não sinérgica

Não mitigável

5

Problemas de saúde

Negativo

Regional

Curto prazo

Temporária/Cíclica

Direta

Irreversível

Cumulativa

Não sinérgica

Não mitigável

6

Perda de habitat da fauna e flora

Negativo

Local

Longo prazo

Temporária

Direta

Reversível

Não cumulativa

Não sinérgica

Mitigável

7

Desestruturação social e comprometimento da reprodução de peixes e de acesso

Negativo

Regional

Longo prazo

Temporária, cíclica ou permanente

Indireta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Mitigável

8

Conflitos territoriais com grandes proprietários de terra

Negativo

Regional

Longo prazo

Temporária, cíclica ou permanente

Indireta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Mitigável

9

Calor intenso

Negativo

Regional

Curto prazo

Temporária

Indireta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Não mitigável

10

Queima de moradias

Negativo

Local

Médio prazo

Temporária

Direta

Reversível

Não cumulativa

Não sinérgica

Não mitigável

11

Empobrecimento do solo

Negativo

Regional

Longo prazo

Permanente

Indireta

Irreversível

Cumulativa

Sinérgica

Mitigável

12

Secamento dos corixos e baías

Negativo

Entorno

Médio prazo e permanente

Temporária, permanente

Indireta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Mitigável

13

Dificuldade de respirar

Negativo

Entorno

Curto prazo

Temporária

Direta

Reversível

Não cumulativa

Não sinérgica

Mitigável

14

Mortandade de peixes pelo calor

Negativo

Regional

Médio prazo

Temporária

Indireta

Irreversível

Não cumulativa

Não sinérgica

Não mitigável

15

Projetos que não refletem a realidade das comunidades do Pantanal

Negativo

Regional

Longo prazo

Temporária

Indireta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Mitigável

16

Perda da biodiversidade

Negativo

Regional

Longo prazo

Permanente

Direta

Irreversível

Não cumulativa

Sinérgica

Não mitigável

17

Nuvem de cinzas

Negativo

Local

Curto prazo

Temporária

Direta

Reversível

Não cumulativa

Não sinérgica

Mitigável

18

Perda de vidas

Negativo

Local

Longo prazo

Permanente

Direta

Irreversível

Cumulativa

Não sinérgica

Não mitigável

19

Perda de local de reprodução das espécies

Negativo

Entorno

Longo prazo

Permanente

Direta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Não mitigável

20

Falta de comunicação

Negativo

Regional

Longo prazo

Temporária

Indireta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Mitigável

21

Assoreamento

Negativo

Entorno

Médio prazo

Cíclica

Indireta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Mitigável

22

Diminuição da renda da pesca

Negativo

Regional

Médio prazo

Temporária

Indireta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Mitigável

23

Diminuição do turismo de pesca

Negativo

Regional

Médio prazo

Temporária

Indireta

Reversível

Não cumulativa

Sinérgica

Mitigável

24

Predação de animais domésticos

Negativo

Entorno

Médio prazo

Temporária

Direta

Irreversível

Não cumulativa

Não sinérgica

Não mitigável

25

Invasão de ratos nas áreas de cultivo

Negativo

Entorno

Médio prazo

Temporária

Direta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Mitigável

26

Diminuição da abundância de espécies de caranguejo

Negativo

Entorno

Médio prazo

Temporária

Direta

Reversível

Cumulativa

Sinérgica

Mitigável

Gráfico 1 – Pontuação dos impactos do fogo nas comunidades tradicionais do Pantanal.

Biodiversidade Brasileira – BioBrasil.

Fluxo Contínuo e Edição Temática:

Ecologia do Fogo e Conservação do Bioma Pantanal

n.4, 2024

http://www.icmbio.gov.br/revistaeletronica/index.php/BioBR

Biodiversidade Brasileira é uma publicação eletrônica científica do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) que tem como objetivo fomentar a discussão e a disseminação de experiências em conservação e manejo, com foco em unidades de conservação e espécies ameaçadas.

ISSN: 2236-2886