Caça de Vertebrados no Parque Nacional da Serra do Divisor, Acre

Autores

  • Lísley Pereira Lemos Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá/IDSM, Grupo de Pesquisa em Ecologia de Vertebrados Terrestres/GP ECOVERT, Tefé – AM, 69553-225, Brasil.
  • Hani Rocha El Bizri Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá/IDSM, Grupo de Pesquisa em Ecologia de Vertebrados Terrestres/GP ECOVERT, Tefé – AM, 69553-225, Brasil. e Manchester Metropolitan University, School of Science and the Environment, Manchester, M15 6BH, Reino Unido.
  • João Valsecchi do Amaral Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá/IDSM, Grupo de Pesquisa em Ecologia de Vertebrados Terrestres/GP ECOVERT, Tefé – AM, 69553-225, Brasil.
  • Aécio Silva dos Santos Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade/ICMBio, Cruzeiro do Sul - AC, 69980-000, Brasil.
  • Diogo Mitsuru Koga Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade/ICMBio, Cruzeiro do Sul - AC, 69980-000, Brasil.
  • Felipe Ennes Silva Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá/IDSM, Grupo de Pesquisa em Ecologia de Vertebrados Terrestres/GP ECOVERT, Tefé – AM, 69553-225, Brasil. e University of Salford, School of Environment and Life Sciences, Salford, M5 4WT, Reino Unido.

DOI:

https://doi.org/10.37002/biodiversidadebrasileira.v8i1.795

Resumo

Apesar de a caça de animais silvestres garantir a segurança alimentar de populações rurais e indígenas na Amazônia, a atividade representa um desafio para a conservação da biodiversidade. Mesmo em unidades de conservação (UCs), o impacto da extração de vertebrados ainda é pouco conhecido, dificultando ações de manejo e a implementação de estratégias de conservação adequadas à realidade local. Neste trabalho, apresentamos o perfil da atividade de caça de uma comunidade tradicional do Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD), no sudoeste da Amazônia. Através de entrevistas semiestruturadas, realizadas em janeiro de 2018, e de dados originados de atividades de fiscalização desenvolvidas entre janeiro de 2016 e janeiro de 2018, identificamos que 57,9% dos 69 vertebrados com ocorrência confirmada para a área de uso da comunidade Pé da Serra são alvos de caça para alimentação. Cerca de um quinto das espécies ameaçadas em listas nacionais e internacionais é citado como fonte de alimento. Os ungulados, aves, roedores caviomorfos, o tatu-verdadeiro (Dasypus novemcinctus) e o jabuti (Chelonoidis denticulatus) constituíram os grupos taxonômicos mais frequentemente citados e mais apreciados para consumo. Para o abate e captura de vertebrados cinegéticos, foram registrados o emprego da busca ativa, a focagem com uso de lanternas, armadilhas de arma de fogo e a espera. Os moradores da comunidade também utilizam a fauna silvestre para fins medicinais, como animal de estimação e na alimentação de animais domésticos. Apesar de o comércio de produtos animais não ter sido relatado pelos moradores, verificamos que 30,8% das missões de fiscalização realizadas no PNSD resultaram em apreensão de itens silvestres. A biomassa total interceptada foi de 428,08kg. A espécie mais registrada nas apreensões foi C. denticulatus, totalizando 37,9% do total de animais interceptados. A diversidade de espécies e os usos a elas atribuídos, revelados neste levantamento, destacam a importância do recurso faunístico para as populações humanas do PNSD. É através do uso de técnicas produtivas de baixo impacto, associado a empreendimentos locais de geração alternativa de renda, e criação de mecanismos de governança local, que a biodiversidade poderá ser conservada ou mantida na região.

Biografia do Autor

Lísley Pereira Lemos, Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá/IDSM, Grupo de Pesquisa em Ecologia de Vertebrados Terrestres/GP ECOVERT, Tefé – AM, 69553-225, Brasil.

Grupo de Pesquisa de Ecologia de Vertebrados Terrestres (GP ECOVERT), Diretoria Técnico-Científica, Conservação das espécies Animais

Hani Rocha El Bizri, Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá/IDSM, Grupo de Pesquisa em Ecologia de Vertebrados Terrestres/GP ECOVERT, Tefé – AM, 69553-225, Brasil. e Manchester Metropolitan University, School of Science and the Environment, Manchester, M15 6BH, Reino Unido.

Grupo de Pesquisa de Ecologia de Vertebrados Terrestres (GP ECOVERT), Diretoria Técnico-Científica, Conservação das espécies Animais

João Valsecchi do Amaral, Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá/IDSM, Grupo de Pesquisa em Ecologia de Vertebrados Terrestres/GP ECOVERT, Tefé – AM, 69553-225, Brasil.

Grupo de Pesquisa de Ecologia de Vertebrados Terrestres (GP ECOVERT), Diretoria Técnico-Científica, Conservação das espécies Animais

Aécio Silva dos Santos, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade/ICMBio, Cruzeiro do Sul - AC, 69980-000, Brasil.

Gestão do Parque Nacional da Serra do Divisor. Conservação das espécies animais.

Diogo Mitsuru Koga, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade/ICMBio, Cruzeiro do Sul - AC, 69980-000, Brasil.

Gestão do Parque Nacional da Serra do Divisor. Conservação das espécies animais.

Felipe Ennes Silva, Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá/IDSM, Grupo de Pesquisa em Ecologia de Vertebrados Terrestres/GP ECOVERT, Tefé – AM, 69553-225, Brasil. e University of Salford, School of Environment and Life Sciences, Salford, M5 4WT, Reino Unido.

Grupo de Pesquisa de Ecologia de Vertebrados Terrestres (GP ECOVERT), Diretoria Técnico-Científica, Conservação das espécies Animais

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Publicado

09/05/2023

Edição

Seção

Caça: subsídios para gestão de unidades de conservação e manejo de espécies (v. 1)

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